HUMANI GENERIS
Sobre algumas doutrinas errôneas
Carta encíclica do Papa Pio XII
12 de agosto de 1950.
CARTA ENCÍCLICA
Aos Veneráveis Irmãos Patriarcas, Primazes, Arcebispos,
Bispos e outros Ordinários Locais em paz e comunhão com a Sé Apostólica: Sobre algumas
falsas opiniões que ameaçam destruir os fundamentos da Doutrina Católica.
Veneráveis Irmãos:
Saudação e Benção Apostólica.
Introdução
1. As discórdias e os erros do gênero humano, em matéria
de religião e de moral, foram sempre para todos os bons, e principalmente os fiéis e
sinceros filhos da Igreja, causa de profundo pesar, mas são-no hoje de modo especial,
quando vemos atacados por todas as partes os princípios mesmos da civilização cristã.
2. Não é de estranhar que fora do redil de Jesus Cristo
tenham sempre existido tais dissensões e erros. Pois, embora a razão humana,
absolutamente falando, possa chegar com suas forças e lume naturais ao conhecimento
verdadeiro e certo de um Deus pessoal, que governa e protege o mundo com sua Providência,
bem como chegar ao conhecimento da lei natural impressa pelo Criador em nossas almas,
contudo, de fato, muitos são os obstáculos que impedem a mesma razão de usar
eficazmente e com resultado desta sua natural capacidade. As verdades que se referem a
Deus e às relações entre os homens e Deus são verdades que transcendem completamente a
ordem das coisas sensíveis e quando estas verdades atingem a vida prática e a regem,
requerem sacrifício e abnegação. A inteligência humana, na aquisição dessas
verdades, encontra dificuldades tanto por parte dos sentidos e da imaginação como por
parte das más inclinações provenientes do pecado original. Donde vemos que os homens em
tais questões facilmente procuram persuadir-se de que seja falso ou ao menos duvidoso
aquilo que não desejam que seja verdadeiro.
3. Por tais motivos se deve dizer que a Revelação divina
é moralmente necessária para que aquelas verdades que em matéria de religião e moral,
mesmo na presente condição do gênero humano, não são de sua natureza inacessíveis à
razão, possam ser por todos conhecidas com facilidade, com firme certeza, sem mistura
alguma de erro. (Conc. Vaticano I, Const. De fide catholica, c.2, De revelatione).
4. Mais ainda, a mente humana pode até, às vezes,
encontrar dificuldade em formar um juízo certo sobre a "credibilidade" da fé
católica, apesar de serem tantos e tão admiráveis os sinais e argumentos externos,
concedidos por Deus em seu favor, a tal ponto que ainda somente com o lume da razão
natural se pode provar com certeza a origem divina da religião cristã. É que o homem,
movido por preconceitos ou instigado pelas paixões e pela vontade pervertida, não só
pode rejeitar a evidência dos sinais e argumentos externos que se lhe apresentam, como
também resistir às celestes inspirações que Deus lhe infunde na alma.
5. Quem quer que lance os olhos sobre aqueles que vivem
fora do redil de Cristo, facilmente poderá distinguir os principais caminhos por onde
enveredaram muitos dos homens que se dizem cultos e doutos. Há-os que, sem a devida
prudência e discernimento, admitem e propugnam como extensivo à origem de todos os seres
o sistema evolucionista, que nem mesmo no campo das ciências naturais está
indiscutivelmente demonstrado, e com ousadia temerária se entregam à hipótese monista e
panteísta de um universo sujeito às leis de uma contínua evolução. Desta hipótese
logo se aproveitam os fautores do comunismo para propugnar e exaltar com mais eficácia o
seu "materialismo dialético" e arrancar das mentes toda a idéia de Deus.
6. As falsas afirmações de tal evolucionismo, no qual se
repudia tudo o que é absoluto, firme e imutável, prepararam o caminho às aberrações
de uma nova filosofia, que, fazendo concorrência ao idealismo, ao imanentismo e ao
pragmatismo, tomou o nome de existencialismo, porque, rejeitando as essências imutáveis
das coisas, só se preocupa com a existência de cada indivíduo.
7. A essas correntes se vem juntar um falso historicismo
que se atém somente aos acontecimentos da vida humana e subverte os fundamentos de toda e
qualquer verdade ou lei absoluta, seja no campo da filosofia, seja no dos dogmas do
cristianismo.
8. Em meio de tão grande confusão de idéias algum
conforto nos traz ver o bom número daqueles que, imbuídos outrora dos postulados do
racionalismo, desejam agora voltar às fontes da verdade revelada por Deus e proclamam a
palavra de Deus conservada na Sagrada Escritura como fundamento da ciência sagrada. Mas
é ao mesmo tempo doloroso verificar que não poucos dentre esses mesmos, quanto mais
firmemente aderem à palavra de Deus, tanto mais deprimem a capacidade da razão humana, e
quanto mais de boa vontade exaltam a autoridade de Deus Revelador, com tanto maior
acrimônia desprezam o Magistério da Igreja, instituído por Cristo Nosso Senhor para
guardar e interpretar as verdades reveladas. Tal desprezo não só está em contradição
aberta com as Sagradas Letras, mas até mesmo pela experiência se tem mostrado errado.
Quanta vez os próprios dissidentes, que se separaram da verdadeira Igreja, são os
primeiros a lamentar publicamente a confusão e discórdia que entre eles reina no campo
dogmático, reconhecendo assim, embora a seu pesar, a necessidade de um Magistério vivo!
I - A
Igreja Católica face aos erros modernos
1- O papel dos teólogos e dos filósofos
9. Pois bem, essas tendências que mais ou menos se desviam
do reto caminho da verdade, não podem ser ignoradas ou deixadas de lado pelos teólogos e
filósofos católicos, aos quais incumbe a grave missão de defender as verdades divinas e
humanas e difundi-las entre os homens. Mas ainda, é preciso que conheçam bem tais
sistemas, já pela razão de que as doenças não se podem curar se não forem primeiro
bem conhecidas, já porque nessas falsas teorias muitas vezes está latente alguma parcela
de verdade, já finalmente porque esses mesmos erros incitam a inteligência a perscrutar
e a examinar certas verdades filosóficas e religiosas com maior atenção e agudeza.
10. Se os nossos filósofos e teólogos procurassem somente
colher de tais doutrinas, cautelosamente assim estudadas, esses frutos que acabamos de
mencionar, não haveria suficiente motivo para uma intervenção do Magistério da Igreja.
Mas, embora estejamos cientes que em geral os professores e estudiosos católicos se
guardam de tais erros, consta-Nos outrossim que não falta também hoje, como nos tempos
apostólicos, quem, aliciado mais do que convém pela novidades, ou temendo por ventura
ser tido por ignorante das descobertas da ciência nesta época de progresso, procure
subtrair-se à submissão devida ao Sagrado Magistério da Igreja, correndo o perigo de se
afastar insensivelmente da mesma verdade revelada por Deus e arrastar consigo outros ao
erro.
11. Há, além disso, outro perigo ainda maior, porquanto
vai mais encoberto sob a aparência de virtude. São muitos os que, deplorando a
discórdia a que chegou o gênero humano e a confusão de idéias que hoje reina, levados
de um zelo imprudente, se sentem impelidos vigorosamente por um desejo ardente de destruir
as barreiras que separam entre si a tantos homens retos e honestos. E abraçam, em
conseqüência, um gênero de irenismo, que, pondo de lado as questões que dividem os
homens, pretendem não só obter uma união de forças para repelir a avalanche
avassaladora de ateísmo, mas chegam a querer conciliar as oposições que existem no
próprio campo dogmático. E assim como em tempos passados houve quem perguntasse se a
apologética tradicional da Igreja não era um obstáculo, mais que um auxílio, para
ganhar almas a Cristo, assim hoje não falta quem chegue ao ponto de levantar a questão:
se a teologia e os métodos que se usam com aprovação da autoridade eclesiástica no
ensino hodierno, não devem ser, não já aperfeiçoados, mas completamente reformados,
para que o reino de Cristo possa ser propagado com mais eficácia no mundo inteiro, entre
os homens de qualquer cultura e de qualquer opinião religiosa.
12. Se esses tais não tivessem em mira senão introduzir
algumas inovações para adaptar com mais acerto o ensinamento eclesiástico e os seus
métodos às condições e necessidades hodiernas, quase não haveria razão para temer;
mas arrebatados desse imprudente irenismo, alguns chegam a julgar como óbices, para se
restaurar a união fraterna, aquelas mesmas instituições que se baseiam nas leis e
princípios promulgados pelo próprio Jesus Cristo, bem como quanto constitui a defesa e o
sustentáculo da integridade da fé. Se isto se abate, tudo será unificado, sim, mas nos
escombros de uma ruína geral.
13. Essas novas opiniões, nascidas quer de uma deplorável
ânsia de novidades quer mesmo de louváveis intenções, nem sempre são propostas com a
mesma intensidade, com a mesma clareza, ou com os mesmos termos. Nem sempre os seus
propugnadores estão em perfeito acordo entre si. O que hoje está sendo ensinado
veladamente por alguns, com cautelas e distinções, amanhã será proposto publicamente e
sem rebuços por outros mais audazes, com escândalo de muitos, especialmente de jovens
sacerdotes, e com detrimento da autoridade eclesiástica. E se geralmente se usa mais
cautela nos livros que se publicam, o mesmo assunto é tratado com mais liberdade em
folhetos distribuídos em particular, em lições datilografadas, em reuniões. E não só
entre os membros do clero secular e regular, nos seminários e institutos religiosos vão
sendo divulgadas tais opiniões, mas até entre os leigos, especialmente entre os que se
dedicam à educação e instrução da juventude.
2. Os perigos do relativismo dogmático
14. No que se refere à teologia, alguns pretendem reduzir,
quanto podem, o significado do dogma e libertar este do modo de exprimir-se, já desde
muito usado na Igreja, e dos conceitos filosóficos em vigor entre os doutores católicos,
para voltar, na exposição da doutrina católica, às expressões da Sagrada Escritura e
dos Santos Padres. Assim esperam eles que o dogma, despojado dos elementos que dizem
extrínsecos à revelação divina, possa ser proveitosamente comparado com as opiniões
dogmáticas daqueles que se separam da Igreja e deste modo se possa chegar pouco a pouco
à assimilação mútua do dogma católico e das opiniões dos dissidentes. Além disso,
reduzida a estes termos a doutrina católica, pensam eles que desembaraçam o caminho
para, com a satisfação dada às necessidades do mundo hodierno, poder exprimir o dogma
com as categorias da filosofia de nosso tempo, quer sejam do imanentismo, quer sejam do
idealismo, quer sejam do existencialismo ou de qualquer outro sistema. E alguns mais
audazes sustentam que isso se pode fazer e se deve fazer, porque os mistérios da fé,
afirmam os tais, não se podem exprimir por meio de conceitos adequadamente verdadeiros,
mas somente por meio de conceitos aproximativos e sempre mutáveis, através dos quais a
verdade se manifesta, sim, mas ao mesmo tempo necessariamente se deforma. Daí que não
crêem absurdo mas absolutamente necessário que a teologia, segundo as várias filosofias
de que se sirva como de instrumentos no decurso dos tempos, substitua as noções antigas
por outras novas e assim, de maneiras diversas, e até sob certos aspectos contrários,
mas como dizem equivalentes, traduza em linguagem humana as mesmas verdades
divinas. Acrescentam que a história dos dogmas consiste em apresentar as várias formas
sucessivas de que se revestiu a verdade revelada, segundo as diversas doutrinas e
opiniões que no volver dos séculos foram aparecendo.
15. É claro, do que dissemos, que essas tendências não
somente levam ao relativismo dogmático, mas de fato já o contém. Relativismo esse que
é por demais favorecido pelo desprezo que mostram para com a doutrina tradicional e para
com os termos em que ele se exprime. Todos sabem que as expressões desses conceitos,
usadas tanto no ensino das aulas como no mesmo Magistério da Igreja, podem ser melhoradas
e aperfeiçoadas; é por outra parte bem sabido que a Igreja nem sempre usou
constantemente determinadas expressões; é evidente também que a Igreja não pode estar
ligada a um qualquer efêmero sistema filosófico; mas tais noções e tais expressões
que com geral consenso foram através dos séculos encontrados e formuladas pelos doutores
católicos para chegar a algum maior conhecimento e inteligência do dogma, sem dúvida
que não se apóiam em um fundamento tão caduco. Apóiam-se, sim, em princípios e
noções deduzidas de um verdadeiro conhecimento das coisas criadas; e na dedução de
tais noções, a verdade, revelada como estrela, iluminou por meio da Igreja a
inteligência humana. Portanto não é de maravilhar que algumas dessas noções tenham
sido usadas em Concílios Ecumênicos, e que deles tenham recebido tal sanção que a
ninguém é lícito afastar-se delas.
16. Por esses motivos, ter em pouco caso ou rejeitar ou
privar do seu justo valor conceitos e expressões que foram encontradas e aperfeiçoadas
para exprimir com exatidão as verdades da fé, por pessoas de inteligência e santidade
nada vulgares, num trabalho muita vez plurissecular, sob a vigilância do Magistério da
Igreja, e não sem uma ilustração e direção do Espírito Santo, e querer agora
substituí-las por noções hipotéticas e por certas expressões flutuantes e vagas da
nova filosofia, que à semelhança da flor dos campos hoje verdeja e amanhã já secou, é
por certo uma grandíssima imprudência. Seria reduzir o dogma à condição da cana
agitada pelo vento. O desprezo dos termos e das noções usadas pelos teólogos
escolásticos por si mesmo conduz ao enfraquecimento da teologia denominada especulativa,
que tais inovadores julgam, por se apoiar em razões teológicas, desprovidas de
verdadeira certeza.
3. O papel do Magistério da Igreja
17. Infelizmente esses amantes de novidades passam
facilmente do desprezo da teologia escolástica ao pouco caso e até ao desprezo do
próprio Magistério da Igreja, que dá com sua autoridade tão notável aprovação a
essa teologia. O Magistério Eclesiástico é apresentado por eles como um empecilho ao
progresso e um estorvo para a ciência; ao mesmo tempo que é considerado por certos
acatólicos como um freio já injusto para alguns teólogos mais cultos que procuram
renovar a sua ciência. E embora este Sagrado Magistério deva ser para qualquer teólogo
a norma próxima e universal de verdade em matéria de fé e de moral (pois Cristo Senhor
Nosso lhe confiou todo o depósito da fé - Sagrada Escritura e tradição divina - para
guardá-lo, defendê-lo, interpretá-lo), contudo por vezes é ignorado como se não
existisse o dever que têm os fiéis de fugir também daqueles erros que em maior ou menor
medida se aproximam da heresia, dever portanto de "observar as constituições e
decretos com os quais essas falsas opiniões foram proscritas e proibidas pela Santa
Sé" (Código de Direito Can., cân. 1324; cf. Conc. Vaticano I, Const. De fide
catholica, c.4, De fide et ratione, depois dos cânones). O que as Encíclicas dos Sumos
Pontífices expõem sobre o caráter e a constituição da Igreja é por alguns
intencional e habitualmente deixado de parte com o intuito de fazer prevalecer um conceito
vago, que eles dizem terem tomado dos antigos Padres, especialmente Gregos. Os Sumos
Pontífices, dizem tais propugnadores, não tencionam dirimir as questões disputadas
entre teólogos; é portanto necessário voltar às fontes primitivas e com os escritos
dos antigos se devem explicar as posteriores constituições e decretos do Magistério
Eclesiástico.
18. Tais afirmações, feitas muito embora com elegância
de estilo, estão cheias de falácia. É verdade que geralmente os Sumos Pontífices
deixam livres os teólogos naquelas questões em que os melhores doutores se acham
divididos entre várias posições, mas a história mostra como muitas questões que em
certa época eram objeto de livre discussão, posteriormente já não o puderam ser.
19. Nem se deve crer que os ensinamentos das Encíclicas
não exijam per se o assentimento, sob o pretexto de que os Pontífices não exercem nelas
o poder de seu Supremo Magistério. Tais ensinamentos fazem parte do magistério
ordinário, para o qual também valem as palavras: "Quem vos ouve, a mim ouve"
(Lc 10,16), além do que, quanto vem proposto e inculcado nas Encíclicas pertence já, o
mais das vezes, por outros títulos, ao patrimônio da doutrina católica. Ademais, se os
Sumos Pontífices no exercício do seu magistério emitem de caso pensado uma decisão em
matéria até então controvertida, é evidente que tal questão, segundo a mente e a
vontade dos mesmos Pontífices, não pode já constituir objeto de livre discussão entre
os teólogos.
20. Também é verdade que os teólogos devem voltar sempre
às fontes da revelação divina do Magistério vivo "se encontrem já explícita ou
implicitamente" (Pius IX, Inter gravissimas, 28 Oct. 1870, Acta, vol. I, p. 260) na
Sagrada Escritura ou na divina Tradição. Acresce que ambas as fontes da Revelação
contém tais e tantos tesouros de verdade que se não poderão jamais, de fato, exaurir:
As ciências sagradas com o estudo das fontes da revelação sempre rejuvenescem;
enquanto, pelo contrário, a especulação que negligencia um estudo mais profundo no
depósito sagrado, consta pela experiência que se torna estéril. Mas por isso mesmo a
teologia, mesmo a chamada positiva, não pode ser equiparada a uma ciência meramente
histórica. Juntamente com as sagradas fontes, Deus deu à sua Igreja um magistério vivo
para iluminar e pôr em relevo aquilo que no depósito da fé não se acha senão
obscuramente e como que implícito. Este depósito, não foi a cada fiel nem mesmo aos
teólogos, que o Divino Redentor o entregou para que o interpretassem autenticamente, -
mas somente ao Magistério da Igreja. Se a Igreja desempenha este seu múnus, como o fez
inúmeras vezes no decurso dos séculos, já com o extraordinário, é claro que é
completamente falso o método de explicar as coisas claras pela obscuras: muito ao invés,
o contrário é o que se impõe a todos. Pelo que o Nosso Predecessor de imortal memória,
Pio IX, ao ensinar que é nobilíssima incumbência da teologia mostrar como a doutrina
definida pela Igreja esteja contida nas sagradas fontes, acrescentou estas palavras
"naquele mesmo sentido no qual foi definida pela Igreja".
4. A autoridade da Sagrada Escritura
21. Voltando, pois, às novas teorias, a que acima
aludimos, por alguns vão sendo proferidas e ensinadas certas doutrinas que põem em
perigo a autoridade da Sagrada Escritura. Alguns permitem-se a ousadia de deturpar o
sentido da definição do Concílio Vaticano, a respeito do doutrina que diz ser Deus o
autor da Sagrada Escritura e renovam a opinião, já várias vezes condenada, de que a
imunidade de erro que compete às Sagradas Letras se estende somente ao que se refere a
Deus e aos assuntos religiosos e morais. Mais; falam com pouco acerto de um sentido humano
dos Livros Sagrados, sob a qual estaria latente um sentido divino, único que têm como
infalível. Na interpretação da Sagrada Escritura não querem ter em conta a analogia da
fé e a tradição da Igreja e sustentam que a doutrina dos Santos Padres e do Sagrado
Magistério se deve regular pela Sagrada Escritura explicada pelos exegetas sob aspecto
meramente humano, em vez de ser a Sagrada Escritura que deva ser exposta segundo a mente
da Igreja constituída por Cristo Nosso Senhor guarda e intérprete de todo o depósito da
verdade revelada.
22. Além disso, o sentido literal da Sagrada Escritura e
sua exposição, elaborada, sob a vigilância da Igreja, por tantos e tão grandes
exegetas, deve ceder o passo, segundo caprichosamente afirmam, à nova exegese, que chamam
espiritual e simbólica, e pela qual a Sagrada Bíblia do Antigo Testamento, que, segundo
eles, hoje na Igreja está como fonte selada, será finalmente aberta a todos. Desta
forma, asseveram, desvanecer-se-ão todas as dificuldades, que não podem causar embaraço
senão àqueles que se atêm ao sentido literal da Escritura.
23. Todos vêem como todas estas doutrinas se afastam dos
princípios e das normas hermenêuticas justamente estabelecidas pelos Nossos
Predecessores de feliz memória, Leão XIII na Encíclica Providentissimus e Bento XV na
Encíclica Spiritus Paraclitus, como também por Nós na Encíclica Divino Afflante
Spiritu.
II - Penetração dos
erros modernos
1. No terreno da teologia
24. Não deve causar maravilha que tais inovações tenham
produzido seus frutos envenenados em quase todas as partes da teologia. Põe-se em dúvida
que a razão humana sem a ajuda da Revelação divina e da graça possa demonstrar, com
argumentos tirados das criaturas, a existência de um Deus pessoal: nega-se que o mundo
tenha tido início e afirma-se que a criação do mundo é necessária, porque procede da
necessária liberalidade do amor divino; como também se afirma que Deus não têm
presciência eterna e infalível das ações livres do homem; opiniões todas contrárias
às declarações do Concílio Vaticano (Cf. Conc. Vaticano I, Const. De fide catholica,
c. I, De Deo rerum omnium creatore)
25. É posto em discussão por alguns se os anjos são
pessoas e se existe uma diferença essencial entre matéria e espírito. Outros desnaturam
o conceito da gratuidade da ordem sobrenatural, sustentando que Deus não pode criar seres
inteligentes sem ordená-los e chamá-los à visão beatífica. Nem basta ainda, pois
deixando de lado as definições do Concílio de Trento, chegam a destruir o verdadeiro
conceito de pecado original e juntamente o de pecado, em geral, como ofensa de Deus, bem
assim o conceito da satisfação que Jesus Cristo deu por nós. Nem falta quem sustente
que a doutrina da transubstanciação, porquanto fundada num conceito de substância já
antiquado, deva ser corrigida, de modo que se reduza a presença real de Cristo na
Eucaristia a um simbolismo, pelo qual as espécies consagradas não seriam outra coisa
senão sinais eficazes de uma presença espiritual de Cristo e da sua íntima união, no
Corpo místico, com os membros fiéis.
26. Alguns não se julgam obrigados a professar a doutrina
que expusemos numa das Nossas Encíclicas, fundada nas fontes da Revelação, segundo a
qual o Corpo Místico de Cristo e a Igreja Católica Apostólica Romana são uma só e
mesma coisa (Cf. Enc. Mystici Corporis Christi, A.A. S. vol. XXXV, p. 193 s.). Alguns
reduzem a uma fórmula vã a necessidade de pertencer à verdadeira Igreja para obter a
salvação eterna! Outros, finalmente, não admitem o caráter racional dos sinais de
credibilidade da fé cristã.
27. É sabido que esses erros e outros semelhantes se andam
espalhando entre alguns de Nossos filhos, levados a engano por um zelo imprudente ou por
uma ciência de falso cunho, e a esses filhos somos obrigados a repetir, com o coração
dolorido, verdades conhecidíssimas e erros patentes, indicando-lhes com preocupação os
perigos de tais erros.
2. No terreno da filosofia
28. Todos sabem quanto apreço dá a Igreja à razão
humana no que concerne à sua capacidade de demonstrar com certeza a existência de um
Deus pessoal, de provar iniludìvelmente pelos sinais divinos os fundamentos da própria
fé cristã, de exprimir com justeza a lei natural que o Criador imprimiu na alma humana,
de conseguir por fim uma inteligência limitada mas utilíssima dos mistérios (Cf.Conc.
Vaticano I). Esta atribuição podê-la-á a razão desempenhar convenientemente e com
segurança, se estiver nutrida daquela sã filosofia que constitui como que um patrimônio
de família, herdado das precedentes gerações cristãs e que reveste uma autoridade
superior, pois que o mesmo Magistério da Igreja confrontou com a própria verdade
revelada os seus princípios e as suas principais asserções, precisadas e fixadas
lentamente através dos séculos por homens de inegável talento. Esta mesma filosofia,
confirmada e comumente admitida pela Igreja, defende o genuíno valor do conhecimento
humano, os indestrutíveis princípios da metafísica - a saber: de razão suficiente, de
causalidade, de finalidade - e propugna a capacidade da inteligência de atingir a verdade
certa e imutável.
Devem-se respeitar as aquisições definitivas da
filosofia
29. Nesta filosofia há certamente muitas coisas que não
dizem respeito à fé e à moral, nem direta nem indiretamente e por isso a Igreja as
deixa à livre discussão dos competentes na matéria; mas não existe a mesma liberdade
com respeito a muitas outras questões, especialmente com respeito aos princípios e
principais asserções de que acima falamos. Pode-se dar à filosofia, também nessas
questões essenciais, uma veste mais conveniente e mais rica; poder-se-á reforçar a
mesma filosofia com expressões mais eficazes, despojá-la de certos meios escolásticos
menos adequados, enriquecê-la ainda - com prudência porém - de certos elementos que
são frutos do progressivo trabalho da inteligência humana. Não se deverá, porém,
jamais subvertê-la com falsos princípios, nem estimá-la só como um grandioso monumento
de valor puramente arqueológico. Pois a verdade e toda a sua manifestação filosófica
não pode estar sujeita a mudanças cotidianas, especialmente tratando-se dos princípios
evidentemente e diretamente conhecidos como tais pela razão humana ou daquelas
asserções, referenciadas já pela sabedoria dos séculos, já pela harmonia com os dados
da Revelação divina. Qualquer verdade que a razão humana por meio de uma pesquisa
sincera for capaz de descobrir, não poderá jamais estar em contraste com uma verdade já
anteriormente demonstrada; porque Deus, suma Verdade, criou e rege o intelecto humano,
não para que às verdades já adquiridas ele contraponha cada dia outras novas, mas para
que, removendo os erros que eventualmente se forem introduzindo, acrescente verdade a
verdade, na mesma ordem e com a mesma harmonia, onde a inteligência humana vai haurir a
verdade. Por isso o cristão, seja filósofo ou teólogo, não abraça sem mais, com
precipitação e leviandade, todas as novidades que aparecem, mas as deve examinar com a
máxima diligência e as deve ponderar no seu justo peso, para não perder a verdade já
adquirida ou corrompê-la, certamente com perigo e dano para a sua fé.
Devem-se respeitar o método e a doutrina de São Tomás
de Aquino
30. Se se considera bem quanto acima está exposto,
facilmente aparecerá claro o motivo por que a Igreja exige que os futuros sacerdotes
sejam instruídos nas ciências filosóficas "segundo o método, a doutrina e os
princípios do Doutor Angélico (Direito Canônico, cân. 1366, 2) já que, como o sabemos
pela experiência de vários séculos, o método do grande Aquino se distingue por
singular superioridade tanto no ensino como na investigação; a sua doutrina harmoniza-se
esplendidamente com a Revelação divina e é eficasíssima tanto para pôr a salvo os
fundamentos da fé, como para colher com utilidade e segurança os frutos de um sadio
progresso (A. A. S. vol. XXXVIII, 1946, p. 387).
31. É deveras para deplorar que hoje a filosofia,
confirmada e admitida pela Igreja, seja objeto de desprezo da parte de alguns, a ponto de,
com imprudência, declará-la antiquada na forma racionalista pelo processo de pensamento.
Vão espalhando que esta nossa filosofia defende erroneamente a opinião de que possa
existir uma metafísica verdadeira de modo absoluto; quando pelo contrário eles sustentam
que as verdades, especialmente as verdades transcendentes, não podem ser expressadas mais
convenientemente que por meio de doutrinas divergentes que se completem entre si, ainda em
certo modo entre si opostas. Daí que a filosofia escolástica com a sua clara exposição
e solução das questões, com a sua exata determinação dos conceitos e suas claras
distinções, pode ser útil - concedem os tais - como preparação para o estudo da
teoria escolástica muito bem condizente com a mentalidade dos homens medievais; mas não
pode dar-nos - acrescentam - um método e uma orientação filosófica que corresponda às
necessidades da cultura moderna. Objetam demais que a filosofia perene não é senão a
filosofia das essências imutáveis ao passo que uma mentalidade moderna se deve
interessar pela existência de cada indivíduo e da vida sempre em devir. E enquanto de
uma parte desprezam esta filosofia, de outra parte exaltam os demais sistemas, antigos e
recentes, de povos orientais e de povos ocidentais, de modo que parece quererem insinuar
que todas as filosofias ou teorias, com o retoque - se necessário - de alguma correção
ou de algum complemento, se podem conciliar com o dogma católico. Mas nenhum católico
pode pôr em dúvida quanto isto seja falso, especialmente tratando-se de sistemas como o
imanentismo, o idealismo, o materialismo, seja histórico seja dialético, ou ainda como o
existencialismo, quando professa o ateísmo ou quando nega o valor do raciocínio no campo
da metafísica.
3. No terreno didático
32. Finalmente, à filosofia de nossas aulas levantam esta
acusação: que ela no processo do conhecimento se ocupa somente da inteligência e faz
caso omisso da função da vontade e do sentimento. Isto não corresponde à verdade: a
filosofia cristã não negou nunca a utilidade e eficácia que provém das boas
disposições da alma toda, para conhecer e abraçar as verdades religiosas e morais; pelo
contrário, ela sempre ensinou que a falta de tais disposições pode ser a causa pela
qual a inteligência, sob o influxo das paixões e da vontade transviada, se obscureça a
tal ponto que já não consiga ver a verdade. Mais ainda, o Doutor Comum é de parecer que
a inteligência pode em algum modo perceber os bens superiores da ordem moral, seja
natural, seja sobrenatural, enquanto experimenta no seu íntimo uma certa co-naturalidade,
seja na ordem natural seja como fruto da graça, com os ditos bens (Cf. S. Tomás, Summa
Theol. II-II, q. I, a. 4, ad 3; e q. 45, a. 2, in c.); e é manifesto quanto este
conhecimento, embora subconsciente, ajude a razão nas suas investigações. Mas uma coisa
é reconhecer o poder que têm a vontade e as disposições da alma para ajudar a razão a
atingir um conhecimento mais certo e mais firme das verdades morais, outra coisa é quanto
vão espalhando esses inovadores, a saber: que a vontade e o sentimento têm um certo
poder intuitivo e que, não podendo o homem discernir com certeza aquilo que deve abraçar
como verdadeiro, se serve da vontade, determinando por ela a sua livre escolha entre duas
opiniões opostas, confundindo assim indevidamente conhecimento e ato de vontade.
33. Não é de admirar que com essas novas teorias corram
perigo as duas ciências filosóficas, por sua mesma natureza intimamente relacionadas com
os ensinamentos da fé: a teodicéia e a ética. Pretendem as novas teorias que o papel de
ambas não é o de demonstrar certas verdades sobre Deus ou outro ser transcendente, mas o
de mostrar como sejam coerentes com a necessidade da vida as verdades que a fé ensina
sobre Deus, Ente pessoal, e sobre os seus mandamentos, e que devem ser admitidas por
todos, para evitarem o desespero e alcançarem a salvação eterna. Todas essas opiniões
e teorias estão em franca oposição com os documentos emanados pelos Nossos
Predecessores Leão XIII e Pio X, e com os decretos do Concílio Vaticano I. Seria
supérfluo deplorar essas várias aberrações, se todos, ainda mesmo no campo das
doutrinas filosóficas, se mostrassem dóceis e reverentes, como de dever, para com o
Magistério da Igreja, a qual por instituição divina recebeu a missão não só de
guardar e interpretar o depósito da fé, mas ainda de vigiar o campo das disciplinas
filosóficas, a fim de que o dogma católico não receba de opiniões menos sensatas
nenhum dano.
III - A Fé e as
ciências positivas
34. Resta agora falar daquelas questões, que, ainda que
pertençam às ciências positivas, são mais ou menos relacionadas com as verdades
reveladas da fé cristã. Não poucos são os que pedem insistentemente que a religião
católica tenha em máxima conta estas ciências, o que é sem dúvida coisa louvável,
quando se trata da fatos realmente demonstrados. Mas é preciso ser muito cauto quando se
trata de puras hipóteses, embora de algum modo fundadas cientificamente, e nas quais se
toca a doutrina contida na S. Escritura ou na tradição. E se tais hipóteses vão direta
ou indiretamente contra a doutrina revelada, então de modo nenhum se podem admitir.
1. Biologia e Antropologia
35. Por essas razões o Magistério da Igreja não proíbe
que, em conformidade com a atual estado das ciências e da teologia, sejam objeto de
pesquisas e de discussões, por parte dos competentes em ambos os campos, a doutrina do
evolucionismo, enquanto ela investiga a origem do corpo humano, que proviria de matéria
orgânica preexistente (a fé católica nos obriga a professar que as almas são criadas
imediatamente por Deus). Isto, porém, deve ser feito de tal maneira, que as razões das
duas opiniões, isto é, da que é favorável e da que é contrária ao evolucionismo,
sejam ponderadas e julgadas com a necessária seriedade, moderação, justa medida, e
contanto que todos estejam dispostos a se sujeitares ao juízo da Igreja, à qual Cristo
confiou o oficio de interpretar autenticamente a S. Escritura e de defender os dogmas da
fé (Cf. Alocução Pontifícia aos membros da Academia das Ciências. 30 nov. 1941 A. A.
S. vol. XXXIII p. 506). Mas alguns ultrapassam temerariamente esta liberdade de discussão
procedendo como se estivesse já demonstrado com certeza plena que o corpo humano se tenha
originado de matéria orgânica preexistente, argumentando com certos indícios achados
até agora e com raciocínios baseados sobre tais indícios; e isto como se nas fontes da
revelação não existisse nada que exija neste assunto a maior moderação e cautela.
36. Quanto, porém, à outra hipótese, isto é, ao
poligenismo, os filhos da Igreja não gozam, de modo nenhum, da mesma liberdade, pois os
fiéis não podem abraçar uma opinião cujos fautores ensinam que depois de Adão
existiriam nesta terra verdadeiros homens que não tiveram origem, por via de geração
natural, do mesmo Adão, progenitor de todos os homens, ou então que Adão representa um
conjunto de muitos progenitores. Ora, não se vê de modo algum como estas afirmações se
possam conciliar com os que as fontes da revelação e os atos do Magistério da Igreja
nos ensinam acerca do pecado original, que provém de um pecado verdadeiro cometido
individualmente por Adão e que, transmitido a todos por geração, é inerente a cada um
como próprio (Cf. Rom 5, 12-19; Conc. Triden., sess. V, cân. 1-4).
2. Ciências Históricas
37. Como nas ciências biológicas e antropológicas,
também nas históricas há quem ousadamente ultrapasse os limites e as cautelas
estabelecidas pela Igreja. De modo particular se deve deplorar certo sistema de
interpretação demasiado livre dos livros históricos do Antigo Testamento; e os fautores
desse sistema, para defender suas razões, apelam infundadamente para a carta não há
muito enviada ao Arcebispo de Paris pela Pontifícia Comissão Bíblica (16 de janeiro de
1948: A. A S., vol. 40 pp. 45-48). Esta carta com efeito, faz notar que os 11 primeiros
capítulos do Gênese, ainda que propriamente falando não concordem com o método
histórico usado pelos melhores autores gregos e latinos e pelos bons historiadores do
nosso tempo, pertencem contudo ao gênero histórico em verdadeiro sentido, mas que deve
ser ainda mais estudado e determinado pelos exegetas: os mesmos capítulos, nota ainda a
citada carta, com um modo de falar simples e figurado, adaptado à mentalidade de um povo
de cultura elementar, ensinam as principais verdades que são fundamentais para a
salvação eterna e contém além disso uma narração popular sobre a origem do gênero
humano e do povo eleito.
38. Se alguma coisa os antigos hagiógrafos tomaram de
outras narrações populares (o que pode ser concedido), é preciso não esquecer que eles
o fizeram com o auxílio da inspiração divina, que na escolha e na valorização dos
documentos os premunia contra todo e qualquer erro. Portanto as narrações populares
inseridas na S. Escritura não podem de maneira alguma ser postas no mesmo plano das
mitologias ou gêneros semelhantes, as quais são fruto mais de uma fantasia exaltada do
que amor à verdade e à simplicidade. Este amor à verdade e esta nativa simplicidade
ressalta de tal modo nos Livros Inspirados, inclusive nos do Antigo Testamento, que
colocam os nossos hagiógrafos indiscutivelmente acima dos antigos escritores profanos.
Conclusão:
Missão dos superiores eclesiásticos
e dos professores das ciências religiosas
39. Sabemos em verdade que a maioria dos doutores
católicos, de cujos valiosos estudos os Ateneus, Seminários, Colégios dos religiosos,
tanto proveito recebem, estão longe de tais erros que aberta ou disfarçadamente vão
sendo hoje divulgados, seja por mania de novidade, seja por desacertado zelo apostólico.
Mas sabemos também que essas falsas opiniões poderão ilaquear os menos cautos.
Preferimos por isso atalhar esses males logo de início, a ter que subministrar o remédio
quando a doença já estiver adiantada.
40. Depois de madura reflexão e consideração, para não
faltar ao Nosso sagrado dever, ordenamos aos Bispos e aos Superiores das Ordens e
Congregações religiosas, impondo-lhes gravíssima obrigação de consciência, que
cuidem diligentissimamente de que nem nas aulas nem em reuniões e conferências, nem em
escritos, de qualquer gênero, sejam propaladas as falsas opiniões de qualquer maneira
ensinadas aos seminaristas ou aos fiéis.
41. Os Professores dos Estabelecimentos Eclesiásticos
saibam que não poderão exercer, com consciência tranqüila, o ofício de ensinar que
lhes foi confiado, se não aceitarem religiosamente as normas que aqui estabelecemos e se
as não observarem exatamente no ensino de suas matérias. Este acatamento e obediência
que nos seu assíduo trabalho devem professar para com o Magistério da Igreja instilem-no
também na mente e na alma dos seus alunos.
42. Procurem com todo o empenho e entusiasmo concorrer para
o progresso das ciências que ensinam; mas abstenham-se também de ultrapassar os limites
que, para a defesa da fé e da doutrina católica, lhes demarcamos. Às novas questões
que o progresso moderno suscitou dêem a contribuição de suas diligentíssimas
pesquisas, mas com conveniente prudência e cautela. Finalmente não julguem, levados por
um falso irenismo, que se possa obter o suspirado retorno dos dissidentes e dos errantes
ao seio da Igreja se não lhes ensina, sinceramente, sem nenhuma corrupção nem nenhuma
diminuição, toda a verdade professada pela Igreja.
43. Fundados nesta esperança, que será aumentada pela
vossa solicitude pastoral, como auspício dos celestes dons e sinal da Nossa paterna
Benevolência damos de todo o coração e cada um de Vós, bem como ao vosso clero e aos
vossos fiéis, a Bênção Apostólica.
Dado em Roma, junto à Basílica de S. Pedro, aos 12 do
mês de agosto do ano de 1950, duodécimo do Nosso Pontificado.
PIO PAPA XII |